A sala

terça-feira, junho 05, 2007

Talvez se tudo fosse azul, ela pensou. Ficaria bem melhor, azuláceas para todos os lados, ela se sentiria em casa, e talvez meio apática, mas não importa muito porque ela não deve explicações a ninguém. Mas quanto tédio, anda tudo bagunçado, e nem é cinza, mas muitas pequenas cores espalhadas que não formam um mosaico bonito. Ela queria beleza, uma beleza agradável, nem precisa ser estonteante, só algo para se sentir quentinha por dentro. Mas estava tudo quebrado, em pedacinhos pelo chão e flutuando no ar, cacos brilhantes pretos, verdes, vermelhos, amarelos, e também tinha um ou outro azul. Não era uma situaçao de todo feia, mas sem dúvida era desconfortável estar no meio dos vidros (ou seriam metais? brilhavam tanto) pontiagudos, estáticos pela sala, em cima de sua cabeça, atrás de sua nuca. Para onde andar? Sabia, em algum lugar dela mesma, que não se machucaria ao caminhar na sala, mas aquela visão era assustadora demais para tentar. E por isso, por covardia, por medo, ficava parada, esperando o dia em que tudo fosse ficar azul, cremoso, líquido. Mas ela tinha que se mexer, e precisava ser logo.

Ela levantou o braço cuidadosamente, apontou para uma ponta preta no ar e quis encostar seu dedo nela. Se estivesse com muito medo, será que sentiria o corte da lâmina mesmo não existindo uma lâmina? Fechou os olhos, fingiu um momento de coragem e aproximou um pouco mais seu dedo daquele objeto pequeno a flutuar no ar - mas sem tocar nele. Ela era fraca, e ao abrir os olhos quis chorar ao ver que o mundo não tinha virado azul, mas continuava aquele caos de partes cortantes. Ela tinha que andar, tinha que ir pra frente - ou para o lado, ou para trás, ou para cima, para qualquer lugar. Ela tinha que tomar uma direção, mas tinha medo, ou pena de si mesma, pois não queria se cortar. Talvez nem acontecesse nada na travessia, mas ela estava paralisada. Fechava os olhos e rezava para que, quando os abrisse, estivesse tudo azul.

1 comentários:

Unknown disse...

texto legal... meio fantástica, muito bom.

 
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