domingo, maio 01, 2005
E era líquida, densa, escura, espiral. Ondas indo e vindo, pretos e cinzas, água. Ela era toda lembranças e desejos. Suspiros, dores. O que esperava? Introspectiva, o olhar perdido não em um falso horizonte, mas dentro de si mesma. Sensações que afogavam, apertavam, preenchiam e transbordavam. Arrepiava... ondas indo e vindo...
O corpo não existia. Sentiria frio se prestasse atenção... não tinha contornos. Não era delimitada... se fundia com o céu, com o chão. Olhava o mar. O mar estava dentro dela. As ondas estavam dentro dela. Caía, pesava. Respirava. Não sentia.
Lua branca e gorda. O mar escuro, noite, areia azul. Vontade de deitar e ser a areia. Quis ser o céu, as estrelas, mas era água. Pura e somente. Suja e inclemente... parcial, ego, inconsciente, eu. Fundo. Dentro. Apertado, escondido, empoeirado. Eu.
O ar estava úmido, o fechar dos olhos estava úmido. Suas mãos corriam pela areia, tudo estava molhado, tudo estava infectado. Só, ela era só. Mas não sofria por isso... (sofria por alguma coisa?) Ela só sentia tudo, tentava ser tudo, mas só conseguia ser água. E não sentia nada. Inconstante, mutável, severa. Parecia tranqüila... mas balançava, chorava, as lágrimas caíam dentro de si e voltavam para seu mundo interno, abastecendo o mar de emoções, lembranças, sensações, pensamentos...
Intuição. Pequeno ponto de luz... luz que não entrava, ela estava fechada. Absorvia tudo a seu redor, mas nada a tocava. Não diretamente. Fechava os olhos e via, escuro, tormenta, nuvens, vento, dor, rochas, duro, frio. Não sentia frio, mas arrepiava. Os olhos escuros deixavam escapar a quem quisesse ver que ela tinha muito dentro dela, mas não contavam o quê. Ela também não contava. Ela não falava. Para quem falar? Para o vento? Para suas mãos na areia?
Latente. Às vezes ficava ofegante sem perceber – na verdade, ela quase nada fazia conscientemente. Pulsava, não ansiosa como o fogo: hoje ela era líquida, espessa. Revolta. Espumante. Secreta. Era só sentir, ir e voltar, ondas quebrando, quanta coisa dentro de si... Chorava, chorava, e quanto mais chorava, mais tudo crescia. Noite eterna... o mar era seu cúmplice, era ela mesma. Estava aqui e lá. Era um pequeno pedaço do mar na areia, era lágrima. Filha, irmã e senhora, balançava, alternava, correnteza. Doía, mas ela não podia ir contra a força das águas. Ela não queria. Ela era. Só. Água.
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